Evangélicos da campanha de Lula estudam formas de minar a base adversária nas igrejas

Pastor Luis Sabanay diz como o evangélicos da campanha tentam neutralizar atuação de Michelle Bolsonaro e combater fake news
Lula e Freixo recebem bênçãos de evangélicos no Rio de Janeiro. Foto: Lina Marinelli/Jornalistas Livres
Lula e Freixo recebem bênçãos de evangélicos no Rio de Janeiro. Foto: Lina Marinelli/Jornalistas Livres

Não foi como em 2018, quando evangélicos garantiram a eleição de Bolsonaro. Mas a maior parte do segmento ainda pesa muito na cesta de votos do candidato do PL, e está levando Lula a focar mais nos protestantes. O Agregador do CEBRAP, somatório de todas as pesquisas analisadas, indica que 48% dos votos evangélicos  estão com Bolsonaroe 30% comLula. Fechadas as urnas no domingo (2/10), as baterias de velhas fake news foram reativadas para atacar o petista. Entre elas, a mentira de que Lula fecharia igrejas, distribuiria o kit gay nas escolas e instituiria o aborto indiscriminado como política pública. Já os seguidores lulistas reavivaram nas redes imagens do adversário na maçonaria , algo que evangélicos abominam por associá-la ao demônio.

Os Jornalistas livres conversaram com o Reverendo Luis Sabanay, pastor presbiteriano. Ele integra o Comitê Evangélico Lula e Alckmin, que estabelece as estratégias da campanha para conquistar os votos do segmento.

Na próxima semana, Lula deverá se reunir com o Comitê e com lideranças do setor para decidir outros pontos da campanha. Há uma ala que pretende ver firmado um compromisso do futuro governo com as pautas de costume. Sabanay não confirma. E diz que os temas a serem tratados no encontro ainda estão em aberto. A entrevista:

O pastor evangélico Luis Sabanay – Foto: Reprodução

Jornalistas Livres – Imagens de Bolsonaro visitando a maçonaria anos atrás, criaram polêmica nos últimos dias, uma vez que evangélicos consideram satânicas as práticas maçônicas. Que impacto teve sobre os protestantes?

Luis Sabanay – O episódio divulgado pela imprensa reacendeu o debate da incompatibilidade entre a fé evangélica e a prática maçônica, o que no segmento evangélico é muito forte. Mas ainda não sei dizer das consequências disto sobre o voto.

Jornalistas Livres – Como contrapor a primeira-dama, Michelle Bolsonaro, que desempenha o papel de mulher de fé, orando pelo marido, pondo-se como coluna de sustentação da campanha dele?

Luis Sabanay – Dando maior visibilidade aos testemunhos que estão sendo gravados e às atividades de mulheres evangélicas com Lula e Alckmin.

Jornalistas Livres – Michelle pediu perdão pelos palavrões ditos por Bolsonaro e afirmou atuar como “ajudadora do marido”. No primeiro turno, sugeriu aos fiéis um jejum pela reeleição do presidente. Pode comentar a postura da primeira-dama?

Luis Sabanay – Todo mundo sabe, entre os evangélicos, que o perdão de pecados só acontece se o pecador se arrepender e confessar seus malfeitos. Entre os evangélicos, não existe essa figura de mediador ou mediadora na relação com Deus. É um tiro no pé.

Jornalistas Livres – Que estratégias o Comitê Evangélico da campanha adotará para conter o apoio a Bolsonaro?

Luis Sabanay – No primeiro turno, a pré-campanha e a campanha Lula-Alckmin conseguiram estagnar o crescimento de Bolsonaro entre os evangélicos e retomar o crescimento de Lula, e de forma ascendente. As pesquisas do segundo turno já demonstram que a tendência se mantém. A nossa estratégia continua sendo não instrumentalizar a religião nem a fé, focar nas propostas de políticas públicas e dialogar com os eleitores dos novos apoiadores de Lula, dos partidos e personalidades que se incorporaram à campanha neste segundo turno. Da mesma forma, vamos ampliar o debate com os evangélicos nos estados onde a Frente Brasil da Esperança e aliados disputam o governo estadual.

Jornalistas Livres – O que ficou decidido na reunião do Comitê Evangélico realizada na segunda (5/10)?

Luis Sabanay – Basicamente discutimos como incorporar os novos segmentos que chegaram à campanha. Precisamos avançar no processo de comunicação, mostrando propostas concretas para o governo. E aumentar a mobilização, principalmente de jovens e mulheres.

Jornalistas Livres – Há uma região do país onde os evangélicos receberão maior atenção da campanha?  

Luis Sabanay – Atuaremos nacionalmente, com prioridade no Rio de Janeiro, em Minas Gerais, São Paulo, nos estados do Centro-Oeste e do Sul.

Jornalistas Livres – Lula estará mais presente em encontros evangélicas, como ocorreu em São Gonçalo (RJ)?

Luis Sabanay – O evento de São Gonçalo foi um marco, no dia 9 de setembro de 2022: reunindo mais de 2 000 mil evangélicos. Serão realizados novos eventos em diferentes estados, com e sem os candidatos. Há várias solicitações da presença de Lula e Alckmin, o que ainda está sendo debatido.

Jornalistas Livres – Como diminuir o poder de pastores que pedem votos no culto ou ameaçam os cristãos que não os acompanham no voto a Bolsonaro?

Luis Sabanay – Não temos como, e nem queremos, desautorizar qualquer autoridade religiosa na intimidade da sua fé. O que queremos é fazer o debate com a população sobre o autoritarismo e a democracia, a civilização e a barbárie. Mostrando a narrativa fascista, do outro lado a sociedade democrática que queremos reconstruir. Com respeito, justiça, amor e paz. Esperamos convencer, nesta tese, parte dos segmentos evangélicos.

Jornalistas Livres – Que avaliação faz do desempenho de Lula no primeiro turno? O que faltou na comunicação com os evangélicos? Por que ele não conseguiu conquistar a maioria, uma vez que é um homem cristão com propostas dirigidas ao povo que sofre?

Luis Sabanay – Historicamente, Lula obteve o maior número de votos em uma candidatura de primeiro turno. A comunicação foi eficiente e estagnou o crescimento do voto evangélico na campanha bolsonarista. Em curto prazo fizemos crescer a campanha de Lula, diminuindo a diferença entre eles. Acertamos em comunicar com as igrejas nas periferias urbanas e rurais. Informamos as propostas de combate à pobreza, à fome, ao desemprego e de recuperação dos direitos sociais e trabalhistas. Comunicamos o combate à violência contra mulheres e jovens e à violência político-religiosa. Falamos da divisão nas igrejas e da questão das armas. Além do enfrentamento às fake news. Para isto, usamos panfletos e muita comunicação nas redes.

Jornalistas Livres – Que papel terão os deputados reeleitos, como André Janones (Avante) e Benedita da Silva (PT) e a  deputada eleita Marina Silva (Rede)?

Luis Sabanay – Eles são dirigentes e figuras públicas evangélicas de grande importância. Têm desempenhado papéis de destaques na campanha desde antes do primeiro turno. Debatem com o segmento evangélico de todo o país e oferecem orientações políticas. Há ainda do nosso lado pastores, pastoras e lideranças leigas de expressão regional e nacional que estão contribuindo muito neste processo.

Jornalistas Livres – Há uma estratégia específica para neutralizar evangélicos do campo bolsonarista, como Damares Alves (Republicanos) e Magno Malta (PL), eleitos para o Senado?

Luis Sabanay – A Bancada da Bíblia diminuiu. O campo progressista e democrático elegeu novos deputados tanto para as Assembleias Legislativas como para o Congresso Nacional, demonstrando uma mudança na correlação de forças no segmento evangélico. Obviamente, isto se reflete na campanha também.

Jornalistas Livres – A campanha de Lula registrou pelo menos 12 redes no TSE, quase a totalidade dirigida a jovens evangélicos. A medida produziu efeitos?

Luis Sabanay – Ainda estamos coletando dados e fazendo pesquisas por segmentos específicos. Mas nas redes que acompanhamos de perto, o resultado está expresso na votação do primeiro turno: houve reversão de votos. Para o segundo, estamos ampliando a relação que estabelecemos nas redes por meio, por exemplo, do Restitui Brasil

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