As lamentáveis publicações de uma charge e de uma caricatura dos jogadores Mbappé e Messi pelo canal dos Jornalistas Livres, na final da Copa do Mundo, desencadearam, como era de se esperar, a indignação de milhares de seguidores que nos acusaram de racismo. Eles estão certos.
Várias pessoas exigiram a exposição dos autores das ilustrações. Mas não faremos isso porque o erro não foi apenas deles. Foi do coletivo como um todo. Os autores desenharam. Mas quem permitiu a publicação foram os Jornalistas Livres. É necessário reconhecer: os procedimentos dos Jornalistas Livres falharam miseravelmente ao permitir que a charge e a caricatura fossem publicadas sem a prévia avaliação delas pelo coletivo, algo que é obrigatório para textos e reportagens. Esse descuido derivou da convicção de que charges e caricaturas são produtos jornalísticos menos sujeitos a erros. Da maneira mais difícil, aprendemos que charges e caricaturas, por lidarem com a risada e o deboche, são muito mais sujeitas a erros. Que o digam os muçulmanos da França, reiteradamente apresentados pelo jornal satírico “Charlie Hebdo” como fanáticos estúpidos. A partir de agora, todas as publicações dos jornalistas livres terão que, necessariamente, passar pelo crivo do coletivo. Quanto aos autores das ilustrações racistas, eles perdem desde já a autorização para postar em qualquer de nossos canais até que reconheçam o cunho racista de seus atos e realizem ações efetivamente antirracistas. E quem fiscaliza isso? Vocês, seguidores, claro.
Até porque Jornalistas Livres são um coletivo composto por maioria de pessoas brancas que jamais sentiram a dor de serem discriminadas e criminalizadas por causa da cor de sua pele. Necessária, portanto, a presença ativa de mais negras e negros no núcleo deliberativo central do coletivo, além da promoção de oficinas de letramento racial, destinadas à formação dos jornalistas brancos. Os jornalistas brancos que se recusarem a participar dessas oficinas perderão a autorização para publicar.
A reunião geral dos Jornalistas Livres decidiu também ampliar a publicação de conteúdos produzidos por e sobre pessoas negras. É preciso escurecer os Jornalistas Livres, fazendo do coletivo uma ferramenta da luta antirracista.
Sobre as charges e ilustrações, especificamente, o coletivo decidiu suspender durante os próximos dois meses esse tipo de publicação. Durante tal período, construiremos um novo grupo de chargistas e ilustradores, composto apenas por negros, indígenas, pessoas LGBTQIA+ e demais grupos estigmatizados. Essa medida tem como propósito mostrar que um outro tipo de humor é possível e necessário, sem o apelo aos estereótipos costumeiros, que reforçam os preconceitos contra pessoas negras, pobres, gays, gagas, gordas e deficientes. Entre o grupo atual de chargistas dos Jornalistas Livres já se encontram alguns negros e negras, além de pessoas LGBTQIA+. É preciso ampliar a participação de pessoas que sofrem preconceitos diversos, de modo a fazer com que o riso e a diversão de muitos não ocorra à custa da dor de outros.
Ficou decidida ainda a criação de uma coluna fixa no site dos Jornalistas Livres sobre racismo e letramento racial de modo a auxiliar na construção de uma campanha didática sobre esses temas. A nova coluna terá ampla divulgação pelos canais dos Jornalistas Livres nas redes sociais. Lamentamos por, somente no apagar das luzes de 2022, entendermos que é de suma importância ter espaços nas redes dos Jornalistas Livres para que o tema do racismo seja enfrentado por nosso coletivo. Afinal não adianta defendermos retoricamente a Democracia, se não entendermos de vez que, enquanto houver racismo, não haverá Democracia.
As medidas anunciadas acima decorrem do desejo do coletivo de aprimorar nossa contribuição à luta pelos direitos humanos. Agradecemos a todas e todos que generosamente —e apesar da gravidade de nosso erro— apresentaram suas críticas indignadas e nos permitiram avançar com medidas corretivas necessárias.
A seguir, uma das críticas recebidas. Acompanhe @africanizeoficial
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