Dos subsídios aos que têm mais à Renda Básica de Cidadania – uma idéia genial e viável

Por Eduardo Suplicy, especial para os Jornalistas Livres

 

O total de receitas das quais o governo federal abriu mão em 2018 com a renúncia fiscal foi de R$ 292,8 bilhões (4,3% do Produto Interno Bruto), segundo informou “O Estado de São Paulo” (3/5/2019). Em entrevista realizada em Genebra, em 13 de março de 2017, a presidenta Dilma Rousseff admitiu ter cometido “um grande erro” ao promover a desoneração fiscal: “Eu acreditava que, se eu diminuísse impostos, eu teria um aumento de investimentos. Eu diminuí e me arrependo disso. No lugar de investir, eles (os empresários) aumentaram a margem de lucro”.

Em verdade, subsídios representam uma transferência de renda para aquelas pessoas que ganham mais. Se formos examinar qual o valor das transferências de renda realizadas através do programa Bolsa Família para as 14.134.323 famílias cuja renda familiar per capita é de até R$ 178,00 por mês e que receberam um benefício médio de R$ 186,23 em abril, observamos que o total transferido pela União para as famílias atendidas alcançou R$ 2,632 bilhões. Se multiplicarmos este valor por 12 meses, teremos um gasto aproximado de R$ 31,5 bilhões anuais.

Considerando que cada família beneficiária do Bolsa Família tem 3,5 pessoas, em média, aquelas 14.134.323 famílias correspondem a cerca de 49,5 milhões de brasileiros aos quais se procura garantir uma renda mínima de R$ 89,00 por mês, pela combinação dos programas Bolsa Família e Brasil Carinhoso.

Possibilidade ou sonho?

Por vezes, se pergunta: será possível se pagar uma Renda Básica de Cidadania igual para todas as pessoas residentes no Brasil, não importa a sua origem, raça, sexo, idade, condição civil ou socioeconômica, inclusive aos estrangeiros aqui residentes há 5 anos ou mais, conforme expressa a Lei 10.835/2004, aprovada por todos os partidos no Congresso Nacional? É importante registrar que diz a lei que a RBC será instituída por etapas, a critério do Poder Executivo, começando pelos mais necessitados, portanto, como faz o Bolsa Família.

Suponhamos que iniciemos a Renda Básica de Cidadania por um valor um pouco melhor do que assegura o Bolsa Família, que é de R$ 89,00 por mês por pessoa, por exemplo, R$100,00, ou R$1.200,00 por ano. Se em vez de transferirmos R$ 292,8 bilhões para as pessoas de maior poder aquisitivo no Brasil com a concessão de incentivos fiscais resolvêssemos adotar a Renda Básica de Cidadania igual para todas as pessoas, modesta, de R$ 100,00 por mês, com um gasto anual da ordem de R$ 250,8 bilhões, estaríamos dando um passo para erradicar a pobreza do país. Imaginem, por exemplo, o impacto que mais R$ 500,00 representaria numa família de pai, mãe e três crianças de baixa renda ou com um dos adultos desempregados.

Em 26 de abril último, realizou-se a assembleia de formalização da Rede Brasileira da Renda Básica formada por acadêmicos, entusiastas e ativistas do tema na Câmara Municipal de São Paulo. Estamos persuadidos de que ela proporciona enormes vantagens, como a extinção de qualquer burocracia envolvida em se ter que saber quanto cada um ganha no mercado formal ou informal, ou o estigma em se precisar dizer quanto ganha, como acontece aos beneficiários do Bolsa Família. Em especial,  a RBC elevará o grau de dignidade e liberdade real para todas as pessoas.

Por todo o planeta Terra avança o debate, a aceitação e o número de experiências com a RBC. Ao lado da universalização da boa qualidade dos serviços de educação e saúde, a instituição da RBC, com os devidos cuidados com respeito ao fenômeno da financeirização, que possa prejudicar os objetivos de emancipação e igualdade por ela proporcionados, deve ser uma realidade do século 21, como aponta Lena Lavinas em seu trabalho “Renda Básica de Cidadania: a política social do século 21? Lições para o Brasil” ; novembro de 2018,  Friedrich Ebert Stiftung.

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornalistas Livres

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