Diário do Bolso: botar fogo nos livros

José Roberto Torero*

Diário, eu estava olhando aqui a lista dos livros que o governo de Rondônia mandou recolher das escolas eacho que tem que botar fogo nessas porcarias mesmo.

Por exemplo:

  • “O melhor de Caio Fernando Abreu”. Esse sujeito não morreu de Aids? Pô, é que nem eu disse esses dias: aidético dá despesa pro país”. E mesmo assim as crianças têm que ler livro dele?  Não pode!

  • Estão chiando por causa de um livro chamado “Macunaíma”. Mas sabem qual é o título completo do livro? “Macunaíma – o herói sem nenhum caráter”. Pô, se não tem caráter, não pode! Manda ler o livro do Ustra. Esse sim!

  • “O Castelo” é do Franz Kakka. Todo mundo sabe que o Weintraub não sabe falar o nome desse cara. Vai constranger o ministro por quê? É sabotagem, não pode!

  • Outro que foi proibido pelo governo do meu amigo Coronel Marcos Rocha (hoje no PSL, mas que vai pro meu partido) é um livro chamado “O harém das bananeiras”, de um tal de Carlos Heitor Cony. Pô, com esse título só pode ser sobre uma boate cheia de “trans”. E todo mundo sabe que “trans”, pra mim, só transgênico. Joga fora esse livro!

  • O “Mar de histórias” é de um tal de Aurélio Buarque de Holanda. Deve ser irmão daquele cantor. Pô, dáos livros dele lá pras crianças maconheiras da Holanda (que, segundo a Damares, são masturbadas pelos pais).

  • Me disseram que “Memórias Póstumas de Brás Cubas” é um livro escrito por um morto. Morto não escreve. Então é Fake News! Aí não pode. Opa! Quer dizer, no zap pode.

  • E esse “Beijo no asfalto”? Nojeira pura!O cara vai beijar o chão? Não dá! Vamos ter mais higiene nesse país, talkei?

  • “Calibre 22”, de um tal de Rubem Fonseca, deve ser livro de mulherzinha. Calibre tem que ser de 38 pra cima! Menos que isso, não pode!

  • Pra encerrar, esse “Mil e uma noites”deve ser sobre orgia. Então não pode! Aliás, segundo a Damares, nem sexo pode mais.O pior, Diário, é que eu nem me importo com esse negócio de abstinência. Depois que eu virei presidente, fiquei intrepável. Não tenho mais tempo pra nada. Vou até te confessar uma coisa: faz tanto tempo que eu não faço sexo, que de vez em quando eu corro de chinelo havaiana pela sala só pra me lembrar do som.

Enfim, fogo nesses livros aí!

@diariodobolso

*José Roberto Torero é autor de livros, como “O Chalaça”, vencedor do Prêmio Jabuti de 1995. Além disso, escreveu roteiros para cinema e tevê, como em Retrato Falado para Rede Globo do Brasil. Também foi colunista de Esportes da Folha de S. Paulo entre 1998 e 2012.

COMENTÁRIOS

Uma resposta

POSTS RELACIONADOS

Diário do Bolso: “se gritar ‘pega Centrão’, não fica um”

O general Augusto Heleno, que cantou “Se gritar ‘pega Centrão’, não fica um, meu irmão…”, agora diz que o Centrão nem existe. Acho que ele vai trocar a letra dessa música pra alguma coisa assim: “Se gritar ‘pega Centrão’, o governo inteiro levanta a mão…”

Diário do Bolso: entupido e não cheirando bem

Os canhotos riem, mas esse meu entupimento veio bem a calhar. Como estou com cagaço de enfrentar essa CPI da covid, aproveitei o meu estado descocomentoso pra me fazer de vítima. Aquela foto de mim cheio de tubo já foi isso. Porque o meu marquetim é esse: quando não tô matando, tô morrendo.

Diário do Bolso: a esquerdalha ri do meu soluço, hic

Teve um sujeito que, hic, disse que o Lira tinha que botar o, hic, pedido de impitimem em pauta, que aí o susto, hic, ia me curar. E outro respondeu que melhor ainda seriadizer que, hic, tinham recuperado as, hic, mensagens do celular do Dominghetti.