Por Homero Gottardello, advogado e jornalista
O silêncio do futuro ex-presidente Jair Bolsonaro comprova aquilo que pelo menos 51% dos brasileiros já sabiam, desde o início das trevas que marcam seu desgoverno: que Bolsonaro é irrelevante. Falando ou calado, esbravejando ou silente, urrando ou murmurando, latindo, relinchando ou, apenas, resmungando, o personagem que insiste em ocupar a cadeira de presidente da República, na prática, já perdeu serventia, não tem mais valor. Seus pensamentos, suas idealizações, suas propostas, suas recomendações médicas não alcançam mais ninguém, para além de um grupinho de fanáticos imbecilizados. Seus melhores amigos, seus apoiadores de ontem já bandearam para o lado do vencedor do pleito de domingo. Seus generais, seus ministros, suas ex-esposas, seus “sócios” nas rachadinhas evitam até mesmo seu nome. Não faltam e nem faltarão exemplos.
Damares Alves, que se elegeu senadora no início de outubro, tem pela frente quatro anos no Congresso, enquanto Bolsonaro enfrentará investigações e processos de todos os tipos e, agora, sem a estrutura de uma advocacia de Estado para defendê-lo. O talibã caminhoneiro, alucinado, tresloucado, será varrido dos bloqueios pela mesma Polícia Rodoviária Federal (PFR) que, no domingo, foi de uma eficiência notável na fiscalização dos eleitores de Lula. Já Augusto Aras, Tarcísio de Freitas, general Mourão, Arthur Lira e, se bobear, até mesmo o amigão Queiroz desembarcaram da canoa furada do almirantado, na primeira aportada. O “menino Ney” também tem mais com o que se preocupar – uma Copa do Mundo que começa em três semana.
Por falar em Damares, o Brasil verá, até com certo alívio e nos próximos dias, que ela não é nada louca. A humorista, que se diz íntima de Jesus Cristo – dele mesmo, o filho de Deus – e “mestra” em Direito Constitucional pela Faculdade Neopestecostal da Goiaba, vai tratar da sua própria sobrevivência política, já que o Senado é um lugar onde pouquíssimos bufões conseguiram sobressair, senão pela arlequinice. Sérgio Moro, que também se elegeu senador, é outro que já virou as costas para Bolsonaro, demonstrando em seus gestos, sempre contidos, um certo prazer vingativo, rancoroso, já que fora desancado pelo “excrementíssimo” depois que deixou o governo.
Pior para Bolsonaro, seus seguidores mais proctológicos, seu rebanho mais bovino, seus discípulos mais fanáticos compõem um grupo que, felizmente, não obteve sucesso eleitoral – alguns bateram na trave, é preciso reconhecer. Estão, portanto, em situação pior que a dele.
Com a família rachada e levando em conta a formação moral da “tropa”, ninguém irá se assustar quando os filhos deste casamento começarem a se digladiar com os daquele, quando a madrasta de um for acusada de alimentar uma relação edipiana com outro – tudo “em nome de Jesus”, é claro. A primeira-dama, espera-se, vai largar Bolsonaro no meio do salão da forma mais vil que se pode imaginar, alegando “diferenças inconciliáveis” e a necessidade de um tempo para se afastar da política e se reaproximar dele: Jesus Cristo – aquele com quem Damares bate altos papos, na goiabeira. Afinal, qualquer pessoa que já transou ao menos uma vez, na vida, sabe que a única virilidade que ela encontrou, neste infeliz matrimônio, foi a da advocacia bancada com dinheiro público.
São tantos que já abandonaram, seguem abandonando e irão, mais cedo ou mais tarde, abandonar Bolsonaro, que nem mesmo os generais de pijama, muito deles já alcançados pela senilidade em função da idade avançada, devem segurar a corda até o fim. O mais representativo desta classe “frotista” – alusão que faço a Sylvio Frota, general descompensado que tentou derrubar o próprio Castelo Branco, durante a ditadura – é Augusto Heleno. O militar que, não por um capricho do destino, foi ajudante de ordens (vulgo, secretário, menino de recados) do próprio Frota, durante este episódio desqualificante, é ministro-chefe de Segurança Institucional – não se pode esquecer. Espécie de Napoleão do hospício e sósia do mundialmente famoso Quasimodo, o “Corcunda de Notre-Dame”, Heleno é o único da claque cujo quadro psiquiátrico ensejaria a permanência canina ao lado de Bolsonaro.
Fora ele, os outros já se foram, estão indo ou irão embora sem olhar para trás. Bolsonaro, que tanto desrespeitou mulheres, negros, mortos pela pandemia, ex-aliados e até mesmo o asfalto das ruas, já viu que não representa nada. Percebeu, em apenas 24 horas, que foi um paraquedista, uma marionete, um boneco de posto de gasolina da plutocracia, um tolo usado de escudo por Paulo Guedes e por aqueles que o indicaram ao futuro ex-presidente. Hoje, escondido, Bolsonaro revela sua indignidade aos que ainda teimam em apoiá-lo, prova que todo ditador, todo torturador é um frouxo, um impotente. Seu medo, sua fraqueza e seu acovardamento só encontrariam remédio, só teriam amparo, só poderiam ser tratados, solucionados, pelo suicídio.
Mas até mesmo o autoextermínio, a autodestruição, necessita de destemor, de dignidade em muitos casos. Mas não, Bolsonaro tem que viver para notar, a cada dia, a cada semana, a cada mês o desprestígio, a depreciação e, por fim, a indiferença com que seu nome será devolvido para o esgoto miliciano. Porque, como disse seu próprio “amigo” Silas Malafaia, Deus o escolheu por ser “vil”, pelo “pouco valor”. Aleluia!!!!!