Contexto para estudo do livro de Josué

Por Gilvander Moreira[1]

Em setembro, Mês da Bíblia, em 2022, somos convidados/as a estudar, refletir e a inspirar-nos no livro de Josué, o 6º livro da Bíblia, com o lema: “Seja firme e corajoso porque Javé teu Deus estará contigo, onde quer que vás” (Js 1,9). O CEBI[1]-MG publicou um livrinho texto-base – LIVRO DE JOSUÉ: luta pela terra, dom e conquista: Uma leitura do livro de Josué feita pelo CEBI-MG. Quero partilhar aqui mais um pouco do nosso artigo que integra o livrinho referido acima: “TERRA DE DEUS, TERRA DO POVO: DOM E CONQUISTA”, com o subtítulo “A luta para conquistar e partilhar a terra no livro de Josué e nos dias de hoje”. Ainda sobre a luta pela terra no nosso querido Brasil.

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) já realizou seis congressos. No seu III Congresso, realizado de 24 a 27 de julho de 1995, como lema de luta para os anos de 1995 a 1999, o MST cunhou: “Reforma Agrária, uma luta de todos!” Duas semanas após, dia 09 de agosto, ocorreu o massacre de Corumbiara, na Fazenda Santa Elina, em Rondônia, pela polícia militar que assassinou nove trabalhadores Sem Terra, inclusive com tiros pelas costas a curta distância. Vanessa dos Santos Silva, criança de sete anos, foi assassinada enquanto fugia de mãos dadas com sua mãe. Dois policiais também morreram no conflito em Corumbiara.

Compreender a luta pela reforma agrária tornou-se pertinente e necessário diante do crescimento do êxodo rural e, consequentemente, da população urbana. Era preciso infundir a ideia de que a luta pela terra e a reforma agrária como política pública interessam não apenas aos camponeses, mas diretamente também ao povo da cidade. Por isso, um dos gritos de luta foi: “Se o campo não planta, a cidade não janta!” Trabalhadores do campo e da cidade, juntos em unidade na luta!

O massacre de Eldorado dos Carajás, acontecido no final de tarde do dia 17 de abril de 1996, foi um divisor de águas na luta pela terra no Brasil. Por isso, 17 de abril tornou-se o Dia Internacional de Luta Camponesa. Após o massacre de Eldorado dos Carajás, o MST deu um salto de qualidade e cresceu muito, pois o sangue dos 21 camponeses tombados na curva do S irrigou a semente da luta pela terra, em uma infinidade de outros territórios no campo brasileiro. Em 18 de dezembro de 1996, o Congresso Nacional aprovou nova lei, prescrevendo o aumento do valor do Imposto Territorial Rural (ITR) para as propriedades rurais improdutivas, bem como o rito sumário que encurta os prazos da lei de desapropriação de terras para fins de reforma agrária. Beneficiou, porém, os latifundiários, que ganharam o direito de receber o pagamento da terra no momento em que o INCRA iniciasse a ação de desapropriação na Justiça e ainda o direito de avaliação do ‘preço justo’ do imóvel. Foi aprovado, ainda, o projeto que autoriza a intermediação do Ministério Público nos conflitos agrários.

A principal arma de atuação política do MST durante esse governo foi a pressão exercida por meio das ocupações de terra. No ano, 2000, Bernardo Mançano defendia a tese segundo a qual a luta pela terra só se torna exitosa pela ocupação de terras. Apertado, o governo federal é forçado a promover pelo menos política de assentamento em áreas de conflitos.

Ao longo da história, tem acontecido também o aprisionamento da terra, bem como lutas populares pela conquista da terra. Em pleno século XXI, o projeto neocolonial-imperial capitalista- extrativista concentra(dor), em nome do lucro desenfreado e da acumulação de capital continua expropriando e superexplorando os camponeses e as camponesas e todos os ecossistemas e biomas. Documentos da FAO-ONU para a América Latina mostram que mais da metade das terras agrícolas cultiváveis está sequestrada nas mãos de 1% de empresários do campo, que compreendem a terra como mercadoria e, por isso, implementam unidades produtivas de commodities para o mercado de exportação. É impressionante constatar que 80% das pequenas propriedades – de agricultores familiares – ocupam menos de 13% do território, sendo que produz cerca de 70% dos alimentos que chegam ao prato do povo brasileiro.

 Assim, posseiros, assentados a partir da mínima reforma agrária já realizada, agricultores familiares e os Povos e Comunidades Tradicionais compreendem a terra como espaço de sustento da vida humana e de todos os seres vivos. Os povos indígenas de Abya Yala têm uma relação horizontal com a terra por compreendê-la como Pacha Mama. Para a mística e espiritualidade libertadora, a terra é Gaia, um grande ser vivo, e não pode continuar sendo objeto de exploração, pois é fonte de vida.

Neste contexto, tornou-se imprescindível buscarmos luzes e forças divinas no livro de Josué, como inspiração bíblica para seguirmos na luta pela terra e pela boa e saudável administração dos territórios já conquistados. Como a luta pela terra aconteceu sob o protagonismo dos povos da Bíblia, segundo o livro de Josué? Eis o que exporemos no próximo artigo.

(Obs.: No próximo artigo, seguiremos a reflexão sobre o livro de Josué).

19/7/2022

Obs.: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.

1 – Chaves de leitura do livro de Josué: Partilha da terra – Mês da Bíblia 2022. Por Ildo Bohn e CEBI/MG

2 – Bíblia, Palavra que Ilumina e Liberta. Dia da Bíblia, 30/9/21. Por Frei Gilvander, Irmã Ivanês etc

3 – Deram-nos a Bíblia. “Fechem os olhos!” Roubaram nossa terra. Xukuru-Kariri, Brumadinho/MG. Vídeo 5

4 – Filme PEDRA EM FLOR, de Argemiro Almeida, 1992. CEBs e Leitura Popular da Bíblia. Frei Carlos Mesters

5 – Frei Carlos Mesters entrevistado por frei Gilvander: Inspirações da Bíblia para sermos humanos

6 – COMUNIDADE, FÉ E BÍBLIA, Carmo Vídeo, 1995. Roteiro: Frei Carlos Mesters, Frei Gilvander e Argemiro


[1] Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos – www.cebimg.org.br


[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG; colunista dos sites www.domtotal.com , www.brasildefatomg.com.br , www.revistaconsciencia.com , www.racismoambiental.net.br e outros. E-mail: [email protected]  – www.gilvander.org.br  – www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

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