De acordo com dados da Campanha Nacional Despejo Zero, existem mais de um milhão de pessoas impactadas por despejos ou ameaças no país. Dessas, cerca de 25 mil pessoas estão no estado de Goiás. Ao passo em que o Brasil caminha para atender às demandas de uma população extremamente afetada pela crise econômica e social, o direito à moradia de famílias pobres ameaçadas de despejo continua sendo um tema em debate.
Protegidas contra despejos durante a pandemia por força da ADPF 828 (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental), a liminar concedida pelo Supremo Tribunal Federal chegou ao seu prazo de efetivação em outubro de 2022. Desde então, foi feita a recomendação da criação de comissões de mediação de conflitos fundiários pelos Tribunais de Justiça, a fim de buscar soluções efetivas para as comunidades e famílias que vivem em ocupações devido à falta de condições de pagar aluguel.
Goiás foi o primeiro estado brasileiro a implementar a comissão de conciliação, composta pelo Tribunal de Justiça, Ministério Público de Goiás , Defensoria Pública de Goiás, OAB e Polícia Militar do Estado. A sociedade civil ficou sem cadeira na mesa de diálogo.
As reuniões da CCF tem ocorrido desde janeiro de 2023 e, nesta segunda-feira (17), às 14 horas, a Comissão de Mediação de Conflitos do TJ-GO realiza uma visita a uma destas ocupações urbanas ameaçadas de despejo em Goiás, a ocupação Alto da Boa Vista.
A comunidade é um caso emblemático, reúne mais de 800 famílias, que vivem em situação de pobreza há mais de 4 anos, e é apontada por especialistas da Campanha Despejo Zero como um caso emblemático para o país. Foi um dos territórios visitados pela Missão do Conselho Nacional de Direitos Humanos, em 2022, onde graves denúncias de violações de direitos humanos foram relatadas e verificadas.
Lideranças de ocupações, de movimentos de luta por moradia e organizações de direitos humanos destacam a visita como uma etapa crucial para garantir os direitos e evitar que mais de 4 mil pessoas moradoras da Ocupação Alto da Boa Vista, com predominância de mulheres e crianças, sejam simplesmente jogadas na rua sem qualquer alternativa ou política pública de habitação, o que poderia causar uma crise humanitária de grandes proporções.
Adriana Ferreira da Silva, 38 anos, é mãe de três filhos e liderança da ocupação Alto da Boa Vista. Ela afirma que a comunidade está apreensiva porque não tem para onde ir. “Aqui somos muitas famílias, mães solos, crianças, idosos que encontraram na comunidade um lar para poder ter estabilidade e construir a vida. Queremos que essa visita seja positiva para nós, não temos para onde ir”, afirma a liderança que trabalha como auxiliar de limpeza.
O Movimento de Trabalhadores e Trabalhadoras por Direitos (MTD) acompanha a comunidade e também expressa que o momento é de insegurança. “Estamos atentos a cada passo dado pela comissão de conflitos fundiários e em diálogo com as milhares de famílias que acompanhamos na região metropolitana de Goiânia, o que queremos é política de habitação para essas famílias em vulnerabilidade social. O governo federal já fez o anúncio do retorno do ‘Minha Casa, Minha Vida’, não podemos ter despejo até que esta importante política de habitação apresente uma alternativa concreta a estas famílias”, explica Dennis Gonçalves, integrante do movimento.
Goiás é o estado que tem marcado na história um dos despejos mais violentos registradas no Brasil. A desocupação do Parque Oeste Industrial segue na memória coletiva dos goianos e das 4 mil famílias que foram despejadas em menos de uma hora. A operação provocou duas mortes, 16 feridos a bala, um paraplégico, 800 detidos. “Não podemos aceitar que Goiás continue a ser palco de grande violações de direitos humanos, precisamos mudar essa cultura”, afirma Dennis.