URGENTE – RENÚNCIA COLETIVA: anulação do afastamento de corregedor revolta comunidade universitária

Foto: Agecom/UFSC
Revogação da portaria pela reitora em exercício foi considerada uma traição ao movimento que tenta restabelecer a verdade e a autonomia da instituição
Reitora Alacoque ao lado do reitor suicidado: traição?

A reitora da UFSC em exercício, Alacoque Lorenzini Erdmann, conseguiu provocar uma verdadeira rebelião entre os dirigentes na manhã de hoje por conta da revogação de uma portaria na tarde de ontem. Com a anulação, ela suspendeu o afastamento e a investigação do corregedor Rodolfo Hickel do Prado, apontado como o maior responsável pela morte do reitor Luiz Carlos Cancellier. No final da manhã desta quarta-feira, todos os sete pró-reitores e parte dos 10 secretários se reuniram num prédio separado da reitoria e decidiram renunciar ao cargo em discordância com a atitude unilateral tomada pela reitora. As demissões devem ser formalizadas ao longo do dia. Os membros do Conselho Universitário (CUN) estão estudando uma forma de anular a decisão dela e de afastar definitivamente o corregedor, que é servidor da Advocacia Geral da União, dos quadros da universidade. Um novo reitor também poderia ser escolhido por eleição direta a partir da reunião extraordinária do CUN, convocada para esta quinta-feira, às 14 horas, por exigência dos conselheiros. Antes, às 10 horas, Alacoque deve apresentar uma proposta de conciliação para levar ao CUN à reunião com os 15 diretores de Centro, solicitada hoje por eles, que também estão incomodados e indagando por providências para investigar as circunstâncias que levaram o reitor ao suicídio.

Há forte pressão entre os dirigentes e representantes da comunidade para que Alacoque renuncie ao cargo e ela mesma chegou a se mostrar inclinada a fazê-lo. Ao saber da reunião dos pró-reitores sem a sua presença, também comunicou internamente sua intenção de renunciar, mas mudou várias vezes de opinião. Provocando uma grave crise institucional na gestão da UFSC, ela revogou na tarde desta terça-feira a portaria assinada na sexta (20/10) pelo gabinete afastando por 60 dias o corregedor interno, considerado o principal agente no processo difamatório e calunioso que culminou com o suicídio do reitor Cancellier. Assinada pelo chefe de gabinete, Áureo Moraes, a portaria determinava também a abertura de Processo Administrativo Disciplinar para investigar representação de graves denúncias de perseguição, intimidações e ofensas praticadas por Rodolfo contra o professor do Curso de Administração Gerson Rizatti Júlio. A reitora alegou ameaça de processo por improbidade administrativa por parte do Ministério Público Federal. Acusada de covardia, sua atitude consternou a família (veja carta abaixo) e foi considerada traiçoeira pelo movimento que busca estabelecer a verdade no caso do linchamento moral do reitor, o Floripa Contra o Estado de Exceção. “A autonomia da universidade foi duramente atingida”, afirmou o chefe de gabinete, que pediu demissão do cargo.

Corregedor considerado o pivô do suicídio do reitor e dos abusos de autoridade que feriram a autonomia da UFSC

Ontem, depois de um dia de forte tensão na tentativa de dirigentes e assessores chegarem a um acordo com Alacoque, grande parte dos pró-reitores já tinha decidido também acompanhar Áureo na entrega dos cargos.  A efetivação de uma demissão coletiva, contudo, dependerá da reunião de amanhã no CUN.

A crise começou a se desenhar já na segunda-feira pela manhã, quando o corregedor impetrou um mandado de segurança para suspender seu afastamento. Em vez de concedê-lo, contudo, o juiz da 3ª Vara Federal, Osni Silva, deu o prazo de dez dias para que a Universidade apresentasse uma justificativa para a publicação da portaria suspendendo-o das funções. Pressionada, segundo fontes do gabinete, pelo próprio algoz do reitor, a vice-reitora anulou todas as possibilidades de afastar o agente externo quando ela mesma revogou o portaria anterior que estabelece a abertura do PAD.

Com a medida, Alacoque fortaleceu o corregedor que, mesmo afastado, continuou exercendo influência, praticando abuso de autoridade e intimidando pessoas da comunidade universitária, inclusive determinando a proibição da entrada de professores no campus, como fez com o reitor.  “A reitora poderia ter deixado o juiz decidir, mas preferiu ela mesma tomar essa decisão que entrega de bandeja a autonomia universitária nas mãos do pivô de toda a desestabilização que levou a essa tragédia”, afirma o ex-procurador da UFSC, Nilto Parma. Essa opinião é compartilhada por grande parte dos membros do Coletivo Floripa Contra o Estado de Exceção, que consideram neste momento fundamental salvaguardar a autonomia universitária, como o professor de jornalismo Samuel Lima, a advogada Rosângela de Souza e a médica Thaís Lippel.

Assim que Alacoque emitiu a anulação da portaria, o chefe de gabinete Áúreo Moraes, professor do Curso de Jornalismo, publicou nas redes sociais carta anunciando sua demissão do cargo por discordância com o recuo sobre a investigação de Hickel, avaliando que ela capitulou à ingerência e aos desmandos de Rodolfo na universidade. Ao contrário do que foi alegado pela reitora em reunião com pró-reitores, garantiu que sua atitude foi transparente e que ela tinha plena ciência da publicação da portaria afastando o inquisidor. O pedido de exoneração de Áureo já foi aceito e publicado.

Portaria da reitora em exercício revoga afastamento do inquisidor

Atendendo a uma solicitação abaixo-assinada por 20 conselheiros, portanto, mais de 1/3 do total de membros do CUN (cerca de 50), a reitora já convocou a sessão extraordinária do CUN para esta quinta-feira (26), às 14 horas, na sala Professor Ayrton Roberto de Oliveira. O documento, encabeçado pelo diretor do Centro de Ciências da Saúde, Celso Spada, solicita a reunião para discutir a criação de uma Comissão de Apuração dos equívocos cometidos interna e externamente que tenham sido responsáveis pela morte do professor Cancellier. O outro item da sessão reivindicada é decidir a forma de contratar empresa especializada para analisar o impacto relacionado ao processo judicial envolvendo a UFSC, conforme deliberado na última reunião do CUN, no dia 17 de outubro. Naquela, reunião, Alacoque foi referendada como substituta de Cau Cancellier no cargo, mas essa decisão ainda não foi confirmada pelo MEC. É muito possível e até provável que ela seja afastada do cargo na próxima. Os nomes para uma disputa já estão sendo cogitados, entre eles o do ex-reitor Lúcio Botelho, médico e professor do Departamento de Saúde Pública e o de Ubaldo Baltazar, diretor do Centro de Ciências Jurídicas (CCJ), que foi professor de Cau Cancellier. Mas o que se reafirma na comunidade universitária é a perspectiva de abertura de eleições diretas, o que está previsto no regulamento quando há impedimento de ambos, reitor e vice.

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Sobre a pressão alegada pela reitora, o procurador do Estado Paulo Ricardo da Silva deu o seguinte depoimento:

“Um absurdo! Se ela está sendo pressionada por agentes externos, que estão interferindo na autonomia da universidade, que denuncie isso abertamente para a sociedade. Não pode temer. Essa universidade não tem um corpo jurídico para defendê-la?” Na mesma linha, o ex-presidente do Sindicato do Serviço Público Estadual, Antonio Batisti, considera que com a decisão Alacoque legitimou Rodolfo Hickel do Porto como uma espécie de interventor na UFSC.

Em nome da família, a cunhada de Luiz Cancellier, Ana Cristina Vieira, candidata a doutorado pela UFSC, fez o seguinte depoimento:

“Luiz Carlos Cancellier deu sua vida à UFSC e ela pouco fez para protegê-lo. E nós estávamos um pouco menos tristes e deprimidos quando finalmente alguém tomou uma atitude digna e justa contra a pessoa que deflagrou o linchamento criminoso, cruel e absolutamente injusto que ele sofreu. Víamos uma luz. E agora estamos aturdidos e incrédulos. O Cau era um diplomata, trabalhador, honesto, humilde, íntegro, gentil e bondoso. Acreditava nas pessoas e na universidade pública e de qualidade. E vimos em seu velório manifestações de amigos, funcionários, professores. Depois manifestações nacionais e internacionais em respeito e apoio ao grande homem que ele foi. E fica muito difícil aceitar e entender que problemas administrativos estão acima de um homem que deu sua vida pela UFSC. Ele foi morto. E era o mínimo a universidade defender o seu nome. Tristeza. Aguardamos a reunião do CUN solicitada pelo Centro de Ciências da Saúde e os encaminhamentos. Temos que alimentar o que existe de bom, e não a maldade. Não podemos deixar que o mal cresça. Precisa florescer o bem e a justiça”.

             Veja a carta do chefe de gabinete Áureo Moraes, que pediu exoneração:

Chefe de gabinete: “reitora cedeu a pressões externas à UFSC, e que representam profundo abalo na nossa autonomia”. FOTO: Agecom/UFSC

À Comunidade Universitária da UFSC e à sociedade

Em respeito à Instituição que me acolheu como aluno em 1984 e, depois, como docente, em 1993, na qual tive oportunidades de fazer uma carreira no serviço público, de conhecer e conviver com pessoas maravilhosas, de aprender com meus alunos e alunas, de trabalhar com colegas brilhantes do Departamento de Jornalismo e, sobretudo, de atuar em diferentes gestões da UFSC nestes 24 anos, expresso, neste momento, minha absoluta frustração com a derrota que nos é impingida.
Os fatos que me levaram a pedir dispensa da função de Chefe do Gabinete do Reitor não me ferem pessoalmente. Mas à UFSC como um todo. Minha decisão se deveu ao ato, legítimo, da Reitora em exercício, de anular a portaria em que eu, exercendo plenamente as prerrogativas da função, determinei a abertura de Processo Administrativo Disciplinar (PAD), com o consequente afastamento, do servidor Rodolfo Hickel do Prado, desde 20 de outubro passado.
Não me interessam as razões que possam ter levado à decisão da Professora Alacoque, a quem respeito e admiro. Mas sei que parte delas é decorrente de pressões que a ameaçaram e partiram de entes externos à UFSC, e que representam um profundo abalo na nossa autonomia.
A publicação da portaria de afastamento está administrativamente correta, formalmente fundamentada e é absolutamente defensável na esfera jurídica. Mas a decisão da Reitora foi, lamentavelmente, política. Com seu gesto ela optou pela manutenção de um servidor externo à UFSC, que desconhece a instituição, que a desrespeita, que a agride, que a ameaça, que a atemoriza, que a despreza. E pela saída de um colaborador de primeira hora, sempre disposto a apoiá-la desde o início da turbulência pela qual vivemos desde que nosso Reitor foi arrancado do nosso convívio.
Em documento entregue à Reitora em exercício, com meu pedido de dispensa, fiz questão de desatacar que, não se pode recuar um milímetro no sentido de buscar a apuração rigorosa de todos os fatos descritos na representação que levou ao PAD e ao afastamento do servidor Rodolfo. E a deixei à vontade para que, se assim julgar, possa imprimir aos fatos que se sucederão, a condução que lhe parecer mais adequada.
Agradeço à toda a equipe da gestão e à fantástica equipe do Gabinete do Reitor, pessoas de alto comprometimento e dedicação que me enriqueceram com seu convívio. Este grupo é inigualável.
E agradeço à comunidade da UFSC com quem mantivemos relações produtivas, amigáveis e propositivas ao longo deste período.
Continuo à disposição.

Prof. Aureo Moraes
Siape 1159850

COMENTÁRIOS

2 respostas

  1. Raquel querida obrigada. Só não sou doutoranda, pretendo em breve. Mas estamos rezando muito, pedindo a Deus que a verdade apareça e que o nome do Cau Cancellier seja exaltado na imprensa. Que jornalistas irresponsáveis e pagos para publicar mentiras e manipular a população sejam alvo de repudio, e procurem um pouco de integridade em suas vidas.

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