Se pararmos para analisar as duas últimas eleições do Brasil em 2018 e 2020, é possível perceber a ascensão de movimentos sociais dentro da política. Principalmente em partidos de esquerda como Psol e PT, que ocuparam sobretudo o legislativo nas câmaras municipais, estaduais e federais, existem vários candidatos que representam alguma causa forte, com o apoio de uma militância fiel. Claro que, se voltarmos no tempo, ativistas como os do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) sempre foram ativos, desde a luta em torno da reforma agrária na década de 80, até a inclusão, anos depois, de pautas como a da comunidade LGBTQIA+ entre os assentados e acampados. Contudo, nunca antes foram vistos tantos militantes ocupando o jogo político de Pernambuco como protagonistas, como se vê agora.
Por Igor Zahir, dos Jornalistas Livres em Pernambuco
Em Pernambuco, principalmente o Psol segue ao pé da letra a máxima de que “não vão fazer política sem nós”, deixando claro que aqueles grupos vistos como minorias, não querem terceiros que falem por eles. Não existe o papo furado de “dar voz” – até porque tem que ser muito prepotente para achar que alguém, nos dias de hoje, precisa de concessão para desabafar suas dores e protestos. Essas pessoas já têm voz, só que sempre tiveram de gritar muito mais alto para que suas vozes fossem ouvidas.
No ano de 2018, quando os mandatos coletivos estouraram no Brasil como algo inovador dentro de um cenário político que parecia engatinhar em termos de renovação, as cinco mulheres das Juntas codeputadas entraram para revolucionar as estruturas da Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe). Não que tenha sido um mar de rosas, ao contrário! Jô Cavalcanti, ambulante; Robeyoncé Lima, advogada trans; Carol Vergolino, produtora audiovisual e figura conhecida no mercado cultural; Katia Cunha, professora; e Joelma Carla, ativista do movimento estudantil, tiveram não apenas que provar como o primeiro mandato coletivo da Alepe poderia dar certo, mas também denunciar os preconceitos, assédios e demais desrespeitos aos quais foram expostas desde que se elegeram, até os dias atuais.
Em 2020, tivemos o maior exemplo de como a militância de esquerda tem poder com a eleição de Dani Portela – destaque como candidata a governadora dois anos antes, a advogada popular, historiadora e feminista negra se tornou a vereadora mais votada de Recife, com mais de 14 mil votos.
No pleito deste ano, Dani é candidata a deputada estadual, na tentativa ousada do Psol de expandir suas cadeiras na Alepe, onde atualmente conta apenas com o coletivo das Juntas. Além de Dani e do professor e vereador Ivan Moraes Filho – outro nome forte entre ativistas -, o partido colocou no jogo um time com as mais variadas bandeiras. Outro dia alguém comentou: “a impressão que dá é que o Psol pegou todos os militantes de Pernambuco e transformou em candidatos”. E é mais ou menos isso (ainda bem!).
Para a Alepe, o partido aposta em nomes como o biólogo e agroecologista Alexandre Pires; a feminista negra Ailce Moreira; a ativista religiosa Salvelina Souza, na luta pelos povos de terreiro; o Coletivo da Diversidade, com três membros LGBTQIAP+ de Caruaru, Arcoverde e Recife (inclusive uma mulher transexual preta iyalorixá); o Coletivo das Mulheres Sertanejas; e o Coletivo Sindicalistas Resistem, com membros de sindicatos dos rodoviários, metroviários e correios.
Já para a Câmara dos Deputados, Robeyoncé Lima e Carol Vergolino vão tentar disputas solo (as Juntas, que buscam reeleição estadual, concorrem este ano representadas por Jô, Katia e Joelma); e além delas destacam-se também Laís Araújo, fundadora do movimento sustentável Xô Plástico, ecofeminista e ativista socioambiental; o comunicador periférico Pedro Stilo; e a candomblecista Janielly Maria Azevedo.
Gente que pensa em gente
No Partido dos Trabalhadores, o movimento negro é representado por jovens que vêm trilhando um caminho brilhante enquanto vereadores: Flávia Hellen, em Paulista; Vinícius Castello, em Olinda; e Gilmar Santos, em Petrolina, são destemidos, questionam o velho sistema da política e não abaixam a cabeça para aqueles veteranos que se acham donos de partidos ou de casas legislativas. Os três são exemplos vivos de que ninguém precisa “dar voz”, mas sim ouvir a voz potente daqueles que, infelizmente, precisam gritar, mas têm muito a dizer. Não tem que dar voz, tem que se calar para ouvir a voz deles.
“Rosa tem o charme das ideias revolucionárias, a disciplina do MST, a força de uma mulher do campo e está preparada para ser deputada estadual de Pernambuco”
Liana Cirne Lins, vereadora do Recife e candidata a deputada federal
Uma das grandes apostas do PT no estado é a jovem Rosa Amorim. Como a própria página dos ativistas menciona, a candidatura dela simboliza o primeiro passo do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST-PE) no cenário eleitoral pernambucano. Aos 25 anos e esbanjando uma poesia latente em sua alma de artista, Rosa é uma mulher negra, lésbica e militante do MST desde a época em que era Sem Terrinha. Ela vem do movimento estudantil, do Levante Popular da Juventude, e conta com o apoio de grandes protagonistas da eleição deste ano, como a candidata ao senado Teresa Leitão e o candidato a governador Danilo Cabral.
No lançamento de sua candidatura, no assentamento onde cresceu em Caruaru, ela foi prestigiada pela Marcha Mundial das Mulheres, o Movimento Brasil Popular, a Pastoral da Juventude Rural, o Movimento Negro Unificado (MNU), entre outras causas sociais. Rosa, em um de seus calorosos discursos, dimensionou a importância deste lugar que ocupa agora:
“Foi no MST, foi nessas fileiras de luta que eu me alfabetizei. Eu me emocionei quando os Sem Terrinha foram até mim na mística, porque quando o movimento luta pela reforma agrária, ele luta também por escolas, saúde, estradas e estrutura para viver nesta terra. Hoje, ao invés da miséria e da fome, estamos aqui no Assentamento Normandia, uma terra conquistada pelo povo, do Brasil que deu certo, lançando hoje a pré-candidatura de uma história que é síntese dos 38 anos de quem produz”.
Na época do ato, o presidente do PT Caruaru e dirigente estadual, Léo Bulhões, comentou sobre a candidata:
“A companheira Rosa Amorim vai entrar em campo, e olhe que de campo ela entende desde que nasceu. É craque! Merece atenção dos ‘olheiros’ porque vai brilhar muito, é uma de nossas mais novas estrelas. Torço por Rosa Amorim, vibro por ver gente de boas ideias ocupando a política, disputando o poder com a missão de distribuí-lo com mais gente. É esse o caminho. Orgulho de poder conviver e abraçar gente que pensa em gente”.