Após 18 horas de sessão, o júri popular que julgou o brutal assassinato do jovem camponês LGBT Lindolfo Kosmaski levou à condenação do acusado Robson José Voinarski a 19 anos e 6 meses de prisão, na madrugada desta quarta-feira (19).
A sentença foi lida pelo juiz Gyordano Weschenfelder Bordignon para um público e familiares, amigos e colegas de trabalho de Lindolfo, que acompanharam todo o julgamento no Fórum de São João do Triunfo, região Sul do Paraná. Lindolfo foi morto no dia 1º de maio de 2021, aos 25 anos, e teve seu corpo totalmente carbonizado. A sentença confirmou a acusação de que se tratou de crime de ódio contra uma pessoa LGBT.
Com cartazes estampando o rosto de Lindolfo e as cores do arco-íris, em referência à luta contra a homofobia, cerca de 20 pessoas organizaram um protesto silencioso em frente ao Fórum, antes do início da sessão. Acompanharam o júri militantes do MST e estudantes da Escola Latino Americana de Agroecologia (ELAA), da APP Sindicato, além de um representante da secretaria nacional LGBTQIA+ do Ministério dos Direitos Humanos, Hiago Mendes Guimarães.
“Nós temos sede de justiça. Ela não trará os nossos mortos de volta, mas poderá responsabilizar os culpados diretos e os responsáveis ideológicos, por mostrar que a homofobia é estrutural, e que está arraigada na nossa sociedade, e que vitimiza muitas e muitas pessoas todos os dias”, afirma Vinicius Oliveira, integrante da direção do MST do Paraná pelo Coletivo LGBTI+, atualmente integrante da coordenação pedagógica da ELAA, onde foi colega de Lindolfo, quando cursaram Licenciatura em Educação do Campo.
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A importância da sentença torna-se ainda maior diante do contexto de injustiça em outros casos de homofobia ocorridos na região, sequer tiveram julgamento. “Toda a defesa do acusado foi pautada em uma moralidade e um conservadorismo que não é novo pra nós, LGBTs, quando um de nós é assassinado. Contudo, não foi suficiente e o júri teve a percepção da gravidade do caso e a evidente culpa do assassino”.
Micheli Toporowicz, advogada que atuou como assistente de acusação no processo, relata o que viveu ao acompanhar o caso de perto: “Foi uma experiência dolorosa. Nestes dois anos eu consegui acompanhar o sofrimento da família com a falta do Lindolfo, porque ele era um provedor e, além disso, era a referência familiar. Por outro lado, foi uma experiência maravilhosa pelo que pude aprender sobre o amor pela bandeira social que o Lindolfo levantava”.
Entre os argumentos para ampliação da pena do acusado está a homofobia, “pois o motivo do crime foi para ocultar a orientação sexual ou bissexual do acusado, assim a homofobia é a aversão ou rejeição por todo tipo de orientação sexual não-heterossexual, bem como a rejeição de certas pessoas a seus próprios desejos”, conforme explica a advogada.
Toporowicz avalia a sentença como justa, em termos processuais, por ter sido considerado homicídio triplamente qualificado, por motivo fútil, meio cruel e recurso que dificultou a defesa da vítima. Robson tem 22 anos e estava preso desde o início das investigações.
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Vida de Lindolfo
Lindolfo nasceu no dia 11 de setembro de 1995, no município de São João do Triunfo, no estado do Paraná, em uma comunidade camponesa de pequenos agricultores e agricultoras, chamada Coxilhão de Santa Rosa.
Sempre muito estudioso, em 2014 após terminar o ensino médio, participou da Jornada de Agroecologia na Escola Milton Santos (EMS), um centro de formação do MST, no município de Maringá (PR). Também tinha o sonho de cursar medicina. Foi para a Escola Latina Americana de Agroecologia (ELAA), na Lapa (PR).
Em 2015 estudou no curso de Licenciatura em Educação do Campo, Ciências da Natureza com ênfase em Agroecologia em parceria com a ELAA e a UFPR/Setor Litoral. Neste período conhece o MST e passa a participar das atividades, se reconhece como gay e começa a participar do Coletivo LGBT do Movimento.
Em 2018, ao concluir o curso volta para sua comunidade, em São João do Triunfo e continua os estudos no Programa de Pós-graduação em Ciências e Matemática, na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Dois anos depois, em 2020, concorre a vereador pelo Partido dos Trabalhadores (PT) no município, para tentar contribuir com a sua comunidade e nesse período também atuava como professor da Rede Estadual de Ensino do Paraná em quatro escolas.
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Homofobia mata
O assassinato do Lindolfo não é um caso isolado. Em 2021, houve no Brasil, pelo menos 316 mortes violentas de pessoas lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e pessoas intersexo (LGBTI+). O número representa um aumento de 33,3% em relação ao ano anterior, quando foram 237 mortes. Os dados são do Dossiê de Mortes e Violências contra LGBTI+ no Brasil.
Entre os crimes ocorridos em 2021, 262 foram homicídios (o que corresponde a 82,91% dos casos), 26 suicídios (8,23%), 23 latrocínios (7,28%) e 5 mortes por outras causas (1,58%).
O dossiê, produzido por meio do Observatório de Mortes e Violências contra LGBTI+, é resultado de uma parceria entre a Acontece Arte e Política LGBTI+, a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) e a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT).