PM executa “Anão da Solidão” dentro de casa em Florianópolis

PM executa “Anão da Solidão” dentro de casa em Florianópolis

Dez policiais militares invadiram hoje, 4/1, no extremo Sul da Ilha de Santa Catarina, a casa de um homem com nanismo de 48 anos e o mataram com quatro tiros à queima-roupa. Muito popular na comunidade da praia da Solidão, Ernesto Shmidt Neto, mais conhecido como Betinho, além de sofrer de nanismo, tinha problemas de saúde mental com manifestações frequentes de surtos psiquiátricos potencializados pelo uso de drogas. Ele vivia com a mãe Joaquina, que alugava quartos na casa para manter a família.

A polícia foi chamada por uma inquilina que se disse ameaçada com uma faca pelo anão após um desentendimento. Ao saber da chegada da polícia, Betinho se trancou no quarto de casa, mas os policiais arrombaram a porta e o executaram. Amigos da vítima na comunidade alegam despreparo e violência desnecessária.

O psicólogo e professor de psicologia, Thomas Teixeira Fidryszewski, também morador da Solidão, conta que acompanhava os recorrentes surtos da vítima. Em depoimento pessoal, ele afirma que Betinho sofria de constantes crises nervosas com acessos de depressão e agressividade, mas era facilmente controlado por ele e amigos da comunidade, sem emprego de violência. Quadros de depressão e uso problemático de drogas são sintomas associados ao estigma social.

O G1 publicou um release da PM alegando que os policiais foram atacados por este homem deprimido de um metro de altura e foram obrigados a se defender. Veja o vídeo gravado por uma pessoa da comunidade e tire suas próprias conclusões. A polícia precisa se defender de gente miúda por este Brasil afora. Betinho, justiça! Justiça para os anões assassinados pela polícia e pelo preconceito neste país!

Ernesto Shmidt Neto foi velado e enterrado neste domingo, 5/11, no final da manhã, no Cemitério do Itacorubi, em Florianópolis

Depoimento da líder da comunidade, Maria Inês Gasparini, médica ginecologista do SUS:
Ontem no meu portão estava uma viatura da PM multando os carros e eu perguntei aos guardas porque tinham matado o anão Betinho. Olhem a resposta:
– Ele tinha uma faca, senhora.
– Mas não podia ser um tiro no pé, se não tinham outra maneira?
– É o procedimento, senhora – respondeu o outro.
– Ou seja: uma faca, um desacato, uma perturbação ou mesmo um engano policial a ordem é a mesma: Mata!!!!
– Portanto, estamos todos sujeitos a esta máxima!!!

Batista, morador da Solidão: Acompanhei todo esse desenlace… Difícil de acreditar que toda aquela força policial não tinha meios de neutralizá-lo. Foi preciso executá-lo…
Parece que a sociedade se amortece com tantas narrativas televisivas de violência que não percebe que “Ela” está sendo tratada primeiro como “joio” para depois ser separada como “trigo”…

Luiz Boabaid, arquiteto, morador da Solidão. “O certo era tentar recuperá-lo numa clínica especializada. Achei uma covardia. Poderiam ter usado uma arma de choque, tirado ele de combate e do surto e levá-lo para uma clínica de recuperação. Uma lástima este desfecho.”

Depoimento do psicólogo e professor de psicologia Thomas Teixeira Fidryszewski

No dia 4 de janeiro, por volta das 11 horas da manhã a Policia Militar de Santa Catarina assassinou o nosso amigo e anão Betinho da praia da Solidão. Beto entrou em surto psicológico e expulsou seus inquilinos ameaçando-os com uma faca. Após o transtorno, Beto trancou-se em sua casa e estava sozinho com uma faca em mãos. Os inquilinos chamaram a polícia e mais de 10 policiais arrombaram a porta de sua casa, em seguida, dispararam mais de 5 tiros em um sujeito com menos de 1 metro de altura que poderia ser facilmente controlado pelos policiais, que em nenhum momento tiveram essa intenção, de fato, confirmando que foi uma execução. Um amigo em comum colocou-se a disposição para conversar com Betinho para acalmá-lo e fazer com que ele se entregasse, mas os policiais o impediram e partiram de maneira direta para o assassinato. Beto era anão e sofria de transtornos psicológicos que o levaram à dependência química, fatos que potencializavam suas crises psicológicas. Filho único de dona Joaquina, era um rapaz com problemas. Entretanto, os moradores sempre o respeitaram e em diversos momentos deram conta de suas crise. Ele era acometido por um comportamento agressivo, porém, facilmente controlado por quem o conhecia. Ficam duas perguntas que, como psicólogo e professor do curso de Psicologia, me acometem nesse momento de luto: como a PM lida com o profissional de psicologia que liberou laudo positivo para fardar, armar e colocar nas ruas sujeitos tão desequilibrados e incapazes emocionalmente? Em quem podemos confiar quando, em outros momentos, a comunidade já acionou a PM e a guarda municipal porque havia sujeitos mal encarados provocando desordem na comunidade e tanto a PM quanto a GM não vieram. Nesse caso, contudo, vieram rapidamente atendendo a pedido de uma turista e assassinaram um morador em surto psicológico. Em quem nós, moradores da praia da Solidão, podemos confiar para fazer nossa segurança? A PM serve a quem?

Texto: Raquel Wandelli Fotos: Sandra Alves

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