A justiça é uma mulher negra: subrepresentação de raça e gênero na lista para o STJ

A Promotora de Justiça Lívia Vaz é a única mulher negra indicada
crédito foto: Pedro Moraes

por Franklim Peixinho, em parceria Jornalistas LivresInstituto Juristas Negras, Hori

Paridade de gênero e raça é reparação histórica que urge acontecer, e emerge do Direito Achado nas Encruzilhadas.

Decerto, justiça e legalidade não andam de mãos dadas. Embora esta repouse na aparente neutralidade, em verdade serve aos fins da sociedade patriarcal, racista, sexista e lgbtfobica, que persegue a manutenção e reprodução das violências por meio das sentenças e acórdãos racistas, aporofóbicos e misóginos.

O Diagnóstico Étnico-Racial do Poder Judiciário, elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ)  aponta que a magistratura brasileira é constituída por  83,8% de pessoas brancas.

Nesta secular e contumaz reprodução da branquitude, em setembro de 2023 a justiça federal empossou 30 magistradas e magistrados brancos, em um desfile que se assemelhava a corte dos “braganças” da vida.

fonte: redes sociais

Por outro lado, uma pessoa negra galgar um espaço de poder pela meritocracia é um acinte. A Desembargadora Luslinda Valois, por exemplo, só foi nomeada após travar uma batalha judicial contra o judiciário baiano, já que a mesma fazia jus ao cargo por ambos os critérios: merecimento e antiguidade. Mas, o racismo institucional tentou barrar uma filha de Oyá, que fez valer o fogo de Xangô sobre a sanha racista dos brancos togados.

vídeo redes sociais

Este recorte, que se repete, é o apartheid vivido na sociedade brasileira, em que um poder judiciário branco reproduz decisões lenientes nos assassinatos e agressões criminosas às pessoas negras, como é exemplo a tragédia fluminense do músico negro Evaldo Rosa, morto com 80 tiros. Ou ainda, a absolvição dos PM’s, que há dez anos atiraram na auxiliar de serviços gerais, Claudia Silva Ferreira, uma mulher negra, e arrastaram seu corpo pela rua por 350 metros.

Em terras baianas, se assassinou uma mulher quilombola e seu filho, Mãe Bernadete e Binho do Quilombo, crime cuja solução caminha lentamente para um desfecho. Outrossim, assistiu-se a cumplicidade de pistoleiros, fazendeiros e forças de segurança pública no assassinato de uma mulher indígena, como foi a tragédia que vitimou Nega Pataxó, no sul da Bahia.

fonte vídeo: Teia dos Povos

Um apartheid, sim, porque existem uma classe dominante branca que esta nos cargos de poder e de decisão, em sua maioria, homens cis, heterossexuais e que  comandam a necropolítica contra negros, indígenas,  LGBTQINPA+, alvos da punição penal e da letalidade das forças de segurança pública e milícias privadas no Brasil.

Leila Gonzalez nos convoca a ler como o sexismo e o racismo moldam as estruturas de poder, como também Sueli Carneiro enfatiza a geografia opressiva, em que a mulher negra no mercado de trabalho se encontra no Brasil: abaixo de homens brancos, mulheres brancas e dos homens negros, e atravessadas pelas avenidas de raça, classe e gênero.

E Qual a cor do feminicídio? Qual o gênero da escravidão moderna?

Responde a menina negra do interior, trazida para cidade grande, com intuito de estudar, e viver “como se fosse da família”, só que confinada no quartinho do fundo, e tomada pelos afazeres da cozinha.

Por uma mulher negra no STJ

No STF a expectativa de uma mulher negra foi frustrada pela indicação de dois homens. 

Neste momento, para o STJ, na lista que indica 41 membros do Ministério Público, somente 13 são mulheres. E, entre estas, há uma mulher negra, o que expressa a tônica racista e sexista dos espaços de poder, mas sinaliza para a necessária indicação da única mulher negra, a Dra. Livia Vaz.  

Instituto Juristas Negras (IJN)  e o Movimento Mulheres Negras Decidem (MND), alimentam e difundem a radical reformulação do Poder Judiciário brasileiro, a partir da ocupação por mulheres negras em arenas como o STJ, STF e demais postos da magistratura no Brasil, cujos cargos de poder, buscam uma justiça pluriversal e emancipatória para todxs.

Uma revolução cultural e pedagógica na mentalidade colonial brasileira se faz necessária, e passa pelo aquilombamento e enfrentamento nos moldes de Maria Felipa, Dandara, Maria Zeferina, Aqualtune, Lélia Gonzalez e Lívia Vaz

foto: Lívia Vaz

Leia abaixo o texto manifesto do Instituto Juristas Negras (IJN) e o Movimento Mulheres Negras Decidem (MND) pela indicação da única mulher negra na lista para o STJ:

Franklim Peixinho é homem negro, Ogan do Ilê Axé Ikandèlé, professor de História e Direito Penal, advogado antirracista, militante do Círculo Palmarino/Bahia, Dirigente do Instituto Hori. Mestre em Políticas Públicas e em História da África, Diáspora e Povos Indígenas (UFRB), Doutor em Ciências Jurídicas. Pesquisa a necropolítica da guerra às drogas no Brasil e educação antirracista.

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