A favela é a nova senzala, diante da estupidez da elite do atraso

"A polícia tem como objetivo manter a elite intacta, não permitindo a ascensão do povo pobre"

Geraldo Elísio, jornalista, escritor e artista multimídia

Hélio Luz, ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro, recentemente estampou para o mundo civilizado, em entrevista à TV 247, tendo como tema a chacina do Jacarezinho – morte de 28 moradores e um policial – o estúpido pensamento brasileiro. Complexas elites ditas democráticas a evocar o Pai, o Cristo, na verdade fiéis subproduto dos capitães do mato.

Teorizou: “A polícia é o braço do Estado que faz com que o povo marginalizado se conforme e permaneça excluído, eliminando qualquer possibilidade de que ele se rebele”.

Será isso mesmo a tão propalada e defendida democracia? Preste bem a atenção que não sou eu, um anarquista filosófico, que estou a dizer isto, e, sim, o doutor Hélio Tavares Luz, ex-deputado estadual no Rio. Recentemente, o ariano capitão do mato vice-presidente da República, Hamilton Mourão, ao taxar núcleos populacionais do lumpesinato, diante de fatos similares, igualmente não foi sequer político ou generoso.

Para ele, o grupamento social e favelado deve morrer, conceito explicitado com a mais plena naturalidade.

Bolsonaro, uma versão bizarra de Maria Antonieta a ter pesadelos com a invenção do médico Joseph Guilhotin, em pleno andamento da Revolução Francesa, em sua descendência pode ter dispensado genes benéficos a uma maior quantidade de melanina, mas, com certeza e dose maior de subserviência buscou a plenitude da capitania do mato junto aos pimpolhos frutos de ocasos sexuais cotizados de zero a números crescentes.

Não quero me estender, entretanto, não posso deixar de citar o general Eduardo Pazuello, com aquela fisionomia de sargento Garcia que mais uma vez deixou escapar o Zorro de suas mãos. Mas voltemos logo ao pensamento multiplicado por tantos nas hostes militares e milicianas.

Quanto ao doutor Hélio Luz, a afirmação pode até deixar transparecer contrariedade em ser assim. Ele tem laivos marcados de consciência. Uma perspectiva melhor. Talvez visto da porta de entrada para mudanças necessárias. Porém, não digo isto em tom de dogma, antes que algum malicioso possa ver em mim algum tipo de concordância plena com o geral da situação.

“Na senzala do século XXI, a favela, a polícia tem como objetivo manter no poder quem está no poder, ou seja, manter a elite intacta, não permitindo a ascensão do povo pobre”, relatou o ex-chefe de polícia. “Isso é o dia a dia do favelado, do excluído”.

É a senzala do século XXI. A favela não integra o Estado Democrático de Direito. Então o que ocorre?

“Nós, normalmente, debatemos dentro do Estado Democrático de Direito; ali, a favela, é a exclusão, é área de exclusão. Então qual é a função da polícia, quer gostem ou não? Quer esteja no livro ou não?”

“A polícia serve ao Estado, ao poder. A quem detém o poder ela serve. Qual é a função dela? Manter o controle, manter o poder. O Estado brasileiro é um Estado escravista, que exclui, que separa, separa muito. O abismo social aqui é muito grande. Então, como é que você vai manter isso com tranquilidade? Como é que você vai manter o poder, fazer esse acúmulo sem ser perturbado? Porque é isso que nós vemos”.

De acordo ele, Luz, a polícia tem a tarefa de fazer o controle social. “Censo de 2010: população da cidade do Rio de Janeiro é de 6,3 milhões de pessoas. Em relação ao Censo de 2000, havia crescido 5%. A população que reside em favela cresceu 22%. Então, essa diferença mostra que inchou, que aumentou, mostra a concentração, mostra a desigualdade. Qual é a função dessa polícia? É manter isso sob o controle. É manter o pessoal sob controle”.

“O cara não gosta de estar lá, o cara quer ser classe média, no mínimo. E não dá. Pois são 84% da população brasileira que está excluída. Qual é a função da polícia? Manter os 84% sob controle. No caso do Rio de Janeiro, em 2010 era 1,6 milhão de favelados. Como é que você mantém 1,6 milhão tranquilos? O cara não tem trabalho. Arranca. O cara não tem condição de moradia. Arranca. Arranca todos os direitos dele e ele está sobrevivendo. Então, essa é a função da polícia: fazer o controle social a qualquer preço”.

Não creio eu que alguém além dos interessados em manter o status quo concorde com isto. São sempre os ricaços pouco interessados em mudanças, incultos e viveiros de genes a requerer combates permanentes e caros contra aqueles que buscam justiça em vez de se tornarem cúmplices com o estigma de capitães do mato.

São aceitos no estrito cumprimento do dever, com raríssimas oportunidades de atingir graus maiores de participação coletiva e, assim mesmo, considerados substratos de categoria social. Marginalizados dentro das condições exigíveis que não impinjam máculas a quem lhes abastece as contas bancárias.

Morrem de medo do surgimento de um novo Zumbi de Palmares ou capoeiras a lhes dificultar o trabalho.

Tal fenômeno atinge igualmente capitães do mato de pele alva, olhos azuis que lhes permitam disfarçar em brancos, porém sabendo as suas raízes estarem fincadas não em veios de nobreza ou divergências de cunho social raro, o que é pouco a acontecer, mas em esteios de pobreza largados para trás. Muitos à custa de trabalho eficaz, duro e perseverante, criando novas formulas de relacionamento social. Outro tanto, maiores, optando pela aplicação de velhas fórmulas da FDCDM – Faculdade dos Capitães do Mato.

O Brasil é pródigo nesta linha de existir e pensar. De onde se vê que o dinheiro tem muito dinheiro. Tanto que não podemos contar com facilidade, em contraponto ao átimo de segundo que torna possível a conclusão de incapacidade de suprimir subserviências ou esmagar complexos adubados com ferozes e tonitruantes arroubos de falas odientas.

Simplesmente desconhecendo mesmo o que aprendem em faculdades.

O imbecil do ministro Paulo Guedes, prima ballerina da Faculdade dos Capitães do Mato, ofendeu empregadas domésticas e funcionários públicos enquanto se limita a pedir diáfanas desculpas e seguir o seu rosário de ofensas coadjuvantes de intervenções do porte da Danusa Leão, algum tempo passado, reclamando da possibilidade de encontrar em Paris com o porteiro do prédio onde ela reside.

O mesmo Guedes para quem trabalhadores e trabalhadoras não devem sonhar ir além-fronteiras do Brasil, limitando-se a Nova Iguaçu e outros pontos turísticos maravilhosos sim, que eu amo de paixão, e, exatamente por conhecê-los bem, sei não dispor de cercas a receber visitantes, pelo contrário, se esmeram em gentilezas quando são visitados.

Preconceituoso, racista, talvez alimente e embase a sua tese com o simples gesto de saber poder considerar as Forças Armadas Brasileiras e as organizações estatais de polícia e repressão, emprenhadas dos conceitos tratados parágrafos acima como Guardas Pretorianos, alguns de maior luxo, como o Supremo Tribunal Federal.

E se ocorrer reações contrárias e adversas?

– Simples, que sejam mortos, ainda que sem culpas, no interior de suas próprias casas.

– Salus Populi suprema lex esto – O bem estar do povo seja Lei suprema.

Isto parece não leram os responsáveis pelo Brasil atual, obviamente com as exceções de praxe. E têm certeza absoluta disto, porque jamais se esquecem da Guarda Pretoriana e da sua disposição sem limites para matar e confiantes no mínimo em manter o status quo de Capitães do Mato.

E é exatamente isto, quando no momento dos tradicionais postulados das guerras sofrem mutações que os tornam obsoletos surge esta guerra contra os pobres a partir de falsos arianos que desembarcaram atrasados no processo histórico em feroz disputa por seus privilégios, com nítidos destaques para o quesito salários.

Sabem eles que das tradicionais “tartarugas” das legiões romanas até as formações guerreiras dos últimos anos tais espaços desapareceram. Eles chegaram atrás no tempo de drones e da tecnologia de guerra atual, a exemplo dos arsenais norte-americanos, moscovitas e chineses.

A perda de tempo pode ser explicada de maneira mais simples com a ausência de renovação de métodos, por exemplo, de a Academia Militar de Agulhas Negras. Para que soldados aprendendo a rastejar, cavar “fox hole”, se apresentar em ordem unida e outras mumunhas, valendo o conceito para todos os organismo armados para a eficácia dos combates?

Recentemente, um antigo general disse a Bolsonaro que ele desmontou projetos de um novo domínio militar, doutrina que começou a ser estruturada por volta de 2014. Porém, ninguém havia pactuado nada com a pandemia. Mas boa parte dos grupamentos entende ainda existir tempo para salvar os salários e exercer um domínio interno fora dos quartéis num terreno especifico a que se denomina Pátria.

Sem deixar de levar em consideração que, ainda assim, a Nação fica na dependência de outros interesses que podem ou não aceitar tal distorção.

Resta perguntar se acreditaram mesmo em um cérebro tão limitado como o do atual presidente da República brasileira. Todos os golpes anteriores foram armados nos recintos dos quarteis e clubes militares. Desta vez trocaram as forças do Exército, Marinha e Aeronáutica por forças policiais militares. Assim como deixaram de lado a Igreja Católica substituída por evangélicos, principalmente neo-pentecostais. O que então irá ocorrer?

O futuro responderá. Mas até chegar a nós simples mortais há de se prever tempos duros e marcados por uma sucessão de lutas e mortes. De uma coisa, porém, já se sabe, a sútil quebra da hierarquia com um “Capitão Cloroquina” não oferece boas perspectivas. Afinal, ele chegou ao posto maior pelo voto popular, direto e secreto. Entretanto, padece de cultura suficiente para exercer a tarefa e, além disto, é um primor de ódio, ganância e recalques que eu duvido até mesmo que Sigmund Freud possa explicar.

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornalistas Livres

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