A dialética antropológica de Darcy Ribeiro

Reprodução www.ufes.br

por Henrique Matthiesen

Parte da intelectualidade brasileira sofre os efeitos de nosso complexo do colonizado; embutida em seu pensamento a condição periférica do pensamento humano, são subordinadas às conceituações europeias incapazes de algum senso de altivez ou qualquer ação de protagonismo ideário.

Contrário a esse pensamento mediocrizante e adotando o exercício dialético em uma antropologia de vanguarda, Darcy Ribeiro mergulhou na tarefa herculana de decifrar a alma brasileira e suas contradições.

Neste cenário, compreendeu a gênese da antropologia fazendo a singular divisão entre antropologia e sociologia; porquanto, nos aspectos sociológicos se investigam os movimentos e estruturas sociais de uma forma macro; já a antropologia tem um olhar para dentro, onde os aspectos e as questões culturais que envolvem o homem, como por exemplo: seus costumes, mitos, crenças, rituais e língua são fundamentais para o entendimento na construção civilizatória.

Daí que surge o estudo “darcyniano” sobre “O Povo Brasileiro” e o “Processo Civilizatório” como um exercício antropológico de teorizar – sobre o humano e sobre suas variantes minúcias – a fim de compreender suas mais essenciais feições.

Um anticolonialista convicto buscou uma teoria singular, materialista e dialética onde esquadrinhou os povos orientais, os povos árabes e também os latino-americanos; com suas identidades culturais em uma nova perspectiva ideológica emancipadora.

Inconformado com o julgamento preconceituoso e predatório de que um intelectual do mundo subdesenvolvido tenha a sina de um pensamento tal como subdesenvolvido, Darcy rompe o estereótipo do incivilizado, do selvagem e consagra sua teoria no grande debate intelectual.

Para Darcy: “A história opera, de fato, como uma sucessão de interações competitivas destes componentes dos modos de produção, cada um dos quais, ao se alterar, afeta os demais e lhes impõe transformações paralelas, configurando situações complexas que nunca são rigidamente deterministas nem linearmente evolutivas. Uma produtividade humana acrescida, que torne o homem capaz de produzir excedentes sobre o consumo, não conduz à liberdade, mas à escravidão e às guerras de dominação. Estes efeitos sociais constritivos, operando, por sua vez, como um incentivo à criação de formas ampliadas de mutualidade, permite estruturar unidades sociais cada vez maiores, ativadas por dois processos básicos. Primeiro a estratificação da sociedade em classes e, mais tarde, sucessivas reordenações das relações de produção e a correspondentes transfigurações das classes sociais. Segundo a interação conflitiva entre sociedades tendentes a conduzir à dominação das mais avançadas sobre as mais débeis ou atrasadas e a conversão destas últimas em proletariados externos dos núcleos cêntricos.”

Nesta contextualização Darcy visualiza a clássica luta de classes, conceituada por Karl Marx. Entretanto, segundo os paradigmas da antropologia de Darcy, há novas formas de luta de classe por meio da contínua desculturação dos povos subordinados, seja pelo desenraizamento de suas matrizes étnicas, dialeticamente num processo de transfiguração e expansão civilizatória de formação de novos aspectos socioculturais, ou pela destruição física.
Paralelamente, verifica-se o aprisionamento intelectual refém de uma narrativa eurocentrista, incapaz de vislumbrar ou conjeturar outra perspectiva.
Ao mergulhar na narrativa de uma nova teoria global, Darcy cria sua dialética antropológica.

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