“A cultura é uma dimensão da condição humana”, diz Juca Ferreira

Nessa entrevista exclusiva para os Jornalistas Livres ao ativista e gestor cultural Humberto Meratti, Juca, um dos nomes cotados para assumir a pasta cultural caso Lula seja eleito em 2022, analisa o panorama atual e os desafios do setor cultural e do Brasil
Posse de Juca Ferreira como Ministro da Cultura substituindo Gilberto Gil - Foto: Ricardo Stuckert / PR

Por: Humberto Meratti*

Nascido em Salvador, sociólogo, Juca Ferreira foi Ministro de Estado da Cultura nos governos Lula e Dilma, ex-Secretário de Cultura nos municípios de São Paulo e de Belo Horizonte e por duas vezes vereador na cidade de Salvador. Antes disso foi eleito presidente da UBES no dia da declaração do AI5 (13 de dezembro de 1968), participou da resistência à ditadura, foi exilado político e retornou com a Anistia para trabalhar com arte, educação e proteção do meio ambiente. Atualmente Juca integra a equipe que desenvolve o Plano de Governo Lula 2022, pelo eixo cultural, denominado “Caravanas Culturais” com aplicação de seminários pelo Brasil.

MERATTI – É importante ao Brasil a retomada do Ministério da Cultura? Como um ministério próprio impacta economicamente o setor?

JUCA FERREIRA – A cultura é uma dimensão da condição humana, tanto da vida social como individualmente. Não existe ser humano sem cultura, não existe comunidade, cidade, nação sem sua dimensão simbólica. É essa necessidade de fazer e consumir cultura e arte que nos diferencia dos demais animais. É reconhecida na Declaração dos Direitos Humanos da ONU como um dos direitos básicos de toda a humanidade. É uma obrigação do Estado democrático garantir o acesso pleno de todos cidadãos e cidadãs e criar as melhores condições para o desenvolvimento cultural do país. Dessas condições faz parte a absoluta liberdade de expressão, a liberdade de informação, o fomento e incentivo e diversas políticas públicas e programas. O Ministério da Cultura expressa a importância da cultura para o povo brasileiro e para o país. Assim, o status ministerial possibilita que a cultura seja tratada com a devida importância e também facilita o desenvolvimento das interfaces com as demais políticas públicas, ou seja, educação, saúde etc.

MERATTI – Como você vislumbra, sendo um ex-Ministro da Cultura, o processo de participação social e consequentemente a reconstrução de um Plano Nacional de Cultura, sendo que o setor foi arrasado nos últimos anos, da gestão Temer até chegar no abominável Jair Bolsonaro?

JUCA FERREIRA – Estamos vivendo no Brasil um momento sombrio e ameaçador, e a cultura é um dos alvos do obscurantismo, da ignorância e do reacionarismo da direita e dos dois governos – Temer e Bolsonaro –  após o ilegítimo afastamento da presidenta Dilma. Extinguiram o MinC, estão fragilizando toda a estrutura da cultura e as políticas, programas e projetos. Estão perseguindo artistas e criadores, tentam restabelecer a censura e estão inviabilizando toda a política de fomento e financiamento cultural. A retomada e a reconstrução do que está sendo destruído será o ponto de partida do próximo governo que emergirá das eleições. Restabelecer os mecanismos de participação terá sua relevância, considerando a importância da participação social do setor e da sociedade em geral na formulação execução e avaliação das políticas públicas e dos programas do MinC. Certamente a renovação do Plano Nacional de Cultura será elaborada com ampla participação, a mesma que foi utilizada para sua consecução.

Juca Ferreira, então Secretário de Cultura de São Paulo, participa de aula magna no CELACC/USP em 2013 – Foto: Humberto Meratti

MERATTI – Muito se fala do Conselho Nacional de Política Cultural (CNPC). Qual a sua finalidade?

JUCA FERREIRA – A CNPC é o principal mecanismo de participação social. Tem poderes reconhecidos e regulamentados sendo um instrumento permanente da gestão pública para propor a formulação de políticas públicas de cultura em todo o Brasil.

MERATTI – A ferramenta desenvolvida para a coleta de dados, a SIIC – Sistema de Informações e Indicadores Culturais, apontou em sua última análise pelo IBGE que 4,8 milhões de pessoas atuavam no setor cultural até então. Houve um desmonte desta coleta de informações. O quanto é importante na sua visão, esta coleta de dados? Ela impactava diretamente na construção de novas políticas?

JUCA FERREIRA – Trabalhar com dados e informações aproximam o Ministério da Cultura do acerto, permite sair do subjetivismo e permite ações efetivas mais eficientes e eficazes. Possibilita a criação de novas políticas territoriais ao setor e aos trabalhadores de cultura.

MERATTI – Muito antes da sua efetiva saída do até então Ministério da Cultura, municípios pelo Brasil já não estavam realizando suas regulamentações pelo setor cultural. Elaborações dos Planos, Conselhos Municipais e a criação dos Fundos Municipais ficaram estagnados por completo, mesmo sendo gestão do PT na época. Acredita-se que faltou diálogo junto aos Municípios e apoio dos Estados. Sabe-se ainda que municípios possuíam e outros ainda possuem suas CND’s negativas, o que prejudicou o processo dessa construção coletiva, fora a visão conservadora dos municípios mais distantes das capitais. Neste sentido e, em uma possível retomada ao poder, quais desafios o PT enfrentaria para avançar nesta frente novamente?

JUCA FERREIRA – É necessário a responsabilidade dos Estados e Municípios com o Sistema Nacional de Cultura, permitindo um sistema colaborativo com força e qualidade para beneficiar toda a população brasileira, em todo o território, possibilitando a democratização e o acesso as informações. Estas estruturas são essenciais em todo o Brasil, beneficiando diretamente todos os trabalhadores culturais.

MERATTI – Alguns pré-candidatos para deputado estadual e federal em São Paulo pelo Partido dos Trabalhadores, como o Coletivo Chapa Quente e o Alexandre Padilha, dizem nos bastidores que o Programa de Governo do Lula para 2022 será forte na visão das políticas afirmativas e de “resgate” ao setor cultural. Qual é o seu papel junto à construção deste Programa de Governo?

JUCA FERREIRA – Colaboro com entusiasmo de acordo com a demanda dos que estão no comando da campanha do Presidente Lula. É importante garantir a vitória da democracia e a retomada do desenvolvimento nacional com justiça social e sustentabilidade. Precisamos eleger Lula e derrotar esse fascismo que vem atormentando e provocando sofrimentos ao povo brasileiro, que desvirtua não somente a Cultura, mas também outros setores econômicos no Brasil.

Meratti e Juca Ferreira na Funarte. Foto: arquivo pessoal

* Gestor e ativista cultural. Colaborador dos Jornalistas Livres

COMENTÁRIOS

Uma resposta

  1. Precisamos retornar todo processo da Cultura, em nosso País para dar seguimento aos nossos jovens, artistas e todos que estão envolvidos.

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