A.C.Camargo: Como fica o maior centro de tratamento de câncer de São Paulo?

Hospital deixa de atender pacientes pelo SUS a partir de dezembro deste ano.

Conhecido como uma das principais referências no tratamento de câncer, o hospital A.C. Camargo anunciou nesta semana que deixará de atender pacientes pelo SUS a partir de dezembro deste ano. Sabe-se que há, neste pós-crise da pandemia, uma enorme demanda represada por tratamento de câncer. São centenas de casos que só foram diagnosticados quando os serviços de saúde retomaram uma certa normalidade e passaram a exigir atendimento imediato. E é nesse momento crítico que o hospital A.C.Camargo anuncia sua retirada do SUS.

Por Beatriz Pecinato e Laura Capriglione

Criado em 1953, o hospital, que possui o status de instituição filantrópica, é mantido pela Fundação Antônio Prudente, que leva o nome de seu criador. Hospitais filantrópicos são instituições privadas sem fins lucrativos, que têm contrato com o sistema público, e obtêm isenção do imposto de renda em troca da prestação de serviços à população. Uma das principais formas de o hospital A.C.Camargo prestar esses serviços (em troca de não pagar impostos, repita-se) é através de atendimentos pelo SUS, que é exatamente o que o hospital está cancelando. Ao ser questionada sobre como se dará essa prestação de serviços em troca da isenção de impostos, a assessoria de imprensa do hospital disse que “não pode dar detalhes”, mas que não quer deixar de fazer os atendimentos. Também disse que o A.C.Camargo oferece outros serviços à população, como cursos de pós-graduação e cursos livres.

Atualmente, o hospital conta com cerca de 5 mil pacientes em diferentes estágios de tratamento – desde indivíduos fazendo quimioterapia a pacientes de alta. Os Jornalistas Livres questionaram a comunicação do hospital sobre qual será o encaminhamento dado a todos esses pacientes, agora que o tratamento pelo SUS será encerrado. A assessoria disse que 1.500 pacientes já foram liberados – ou tiveram alta, ou foram realocados para outro hospital, e que cada caso está sendo avaliado. Restam, portanto, 3.500 pacientes que ainda não sabem como darão continuidade a seus tratamentos. A assessoria do hospital disse que desde fevereiro está tentando uma solução junto à Prefeitura de São Paulo, e tem até dezembro para realocar todos os seus pacientes.

O hospital A.C.Camargo está passando por um reposicionamento de marca, que inclui mudanças no nome e logomarca da instituição. Além disso, está investindo pesado na decoração e setor de hotelaria hospitalar, com melhorias no design do mobiliário dos apartamentos e áreas comuns, além de outras comodidades. Aparentemente, essas mudanças, aliadas à exclusão dos pacientes do SUS, visariam a uma mudança no público-alvo da instituição, que passará a atender majoritariamente o público de classe média e classe alta. A assessoria de imprensa, entretanto, negou que esteja ocorrendo essa elitização do hospital.

Imagem do projeto da nova unidade do hospital A.C. Camargo no Itaim. Foto/Reprodução
Imagem do projeto da nova unidade do hospital A.C. Camargo no Itaim. Foto/Reprodução

O anúncio da suspensão dos atendimentos pelo SUS é simplesmente o último ato de uma novela que já se estende há anos. Em 2016, o A.C. Camargo admitiu 1.200 novos pacientes. Esse número tem vindo em um decréscimo acentuado, chegando ao ponto de em 2022 o número de novos pacientes ter despencado para apenas 96. A suspeita proporção foi questionada pelo JL, e a assessoria alegou que os gastos estão muito altos, e mesmo a redução de atendimentos não foi suficiente para cobrí-los.

Outro problema alegado por eles é a falta de atualizações da tabela SUS. Desde a implementação do Plano Real, a tabela SUS foi reajustada em 96%, enquanto a inflação teve reajustes de pouco mais de 630%. Ou seja, existiria uma brutal diferença entre os valores da tabela e da realidade. 

Todos esses argumentos fazem sentido. Mas continuamos perguntando: qual será a contrapartida do A.C. Camargo à isenção de imposto de renda de que é beneficiário? Como o A.C. Camargo pretende retribuir à sociedade pelos milhões em impostos que deixa de pagar todo ano?

ATUALIZAÇÃO (19/08)

Ontem (18), o hospital A.C.Camargo decidiu manter os atendimentos oncológicos através do SUS. O anúncio foi feito por Rodrigo Garcia, candidato à reeleição pelo PSDB. Segundo ele, o Governo de São Paulo e a Prefeitura de São Paulo continuarão complementando o que é pago pelo SUS. Acrescentou, ainda, que o hospital, a Prefeitura e o Estado pretendem encontrar uma sustentabilidade financeira juntos. Apesar da notícia, 1.500 pacientes já foram realocados ou tiveram alta. Será que o hospital pretende trazê-los de volta? No mesmo dia do anúncio do prefeito de São Paulo, A Folha de S.Paulo entrevistou uma paciente que recebeu um e-mail avisando que seria desligada do A.C.Camargo, antes mesmo de saber que os atendimentos pelo SUS parariam de acontecer. Segundo ela, o hospital aconselhou que ela buscasse a UBS mais próxima de sua casa para continuar o acompanhamento de seu caso, um tumor neuroendócrino com metástase no pulmão, fígado e pâncreas. Luciana Magri, a paciente, entrou com uma liminar contra o hospital, e conseguiu agendar consultas para setembro e outubro.

E os outros pacientes, que não tem recursos para contratar um advogado? Terão seus atendimentos retomados?

COMENTÁRIOS

Uma resposta

  1. Eu necessito continuar meus tratamentos pelo SUS,TENHO UMA FILHA Que NECESSITA DE CUIDADOS especiais E NÃO TENHO COMO FAZER MEU TRATAMENTO SE NÃO FOR PELO SUS!Sempre fui muito bem atendida nessa instituição!Que Deus abençoe o Hospital e os profissionais!!

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