Começo o texto parafraseando a emblemática frase da importante filósofa Sueli Carneiro para pontuar sobre a invisibilidade da pessoa com deficiência nos espaços e relações sociais.
O debate ocorrido a partir da fala do presidente Lula sobre a não utilização de muleta ou andador para continuar aparecendo bonito para as pessoas durante a reabilitação da cirurgia no quadril é mais uma denúncia da exclusão da pessoa com deficiência na sociedade.
Pois entre o oportunismo da oposição, e os ataques da direita, e a omissão da situação, e a recorrente justificativa da falta de intenção da esquerda, e os achismos dos vereditos do tribunal da internet, a única perspectiva que não foi contemplada sobre o assunto foi justamente a da pessoa com deficiência.
Você se relaciona com alguma pessoa com deficiência?
Você, por exemplo, buscou, ouviu ou leu alguma pessoa com deficiência sobre essa pauta?
Caso sim, você poderia considerar que tenha buscado, ouvido ou lido um número mínimo e necessário de argumentos para a formulação de uma opinião própria e com base no contraditório, inclusive entre os posicionamentos das pessoas com deficiência?
Você conseguiria destacar quantas pessoas com deficiência você acessou para entender se a fala do presidente Lula foi ou não capacitista?
Mas afinal o que é capacitismo?
Capacitismo é quando a primeira dama do presidente anterior se comunica em libras durante a posse do seu marido enquanto ele ataca a lei de cotas para o trabalho e a educação inclusiva na sequência.
Capacitismo é quando as pessoas com deficiência tem que lutar para terem a sua prioridade legal atendida nas campanhas de vacinação tanto do governo anterior quanto do atual.
Capacitismo é quando o atual presidente diz em uma live do governo realizada nove meses após ele ter subido a rampa do Planalto ao lado de uma pessoa com deficiência utilizando bengala durante a cerimônia da sua posse que bonito é não usar muleta ou andador.
Capacitismo é quando a equipe de comunicação da presidência deixa passar impunemente a fala capacitista do chefe do estado brasileiro.
Capacitismo é quando as bancadas do jornalismo brasileiro não são compostas com pessoas com deficiência nem mesmo quando a legitimidade sobre o debate é dela.
Capacitismo é quando a pessoa com deficiência é destituída de humanidade e relacionada apenas como uma incapacidade até mesmo para participar da disputa de narrativas entre o assistencialismo narcísico da direita, a boa vontade sem intencionalidade da esquerda e as suposições da opinião pública sobre a sua vida.
Marcelo Zig é um homem negro com deficiência, filósofo, consultor de diversidade e inclusão, ativista dos direitos humanos, fundador do Quilombo PcD – coletivo de pessoas negras com deficiência e Coidealizador da Primeira Parada do Orgulho da Pessoa com Deficiência do Brasil. É membro do Núcleo Negro do Jornalistas Livres.